"O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem consolidado o
entendimento de que não entram na base de cálculo do Imposto de Importação as
despesas com descarga, manuseio e conferência de mercadorias em portos – a
chamada capatazia. Há decisões favoráveis aos contribuintes nas duas turmas de
direito público (1ª e 2ª).
A discussão é importante principalmente para as grandes
importadoras e pode gerar créditos milionários, a depender do volume de
mercadorias importadas. Em geral, os custos com capatazia variam de acordo com
o tipo, a especialidade e a fragilidade da carga envolvida. Em alguns casos,
pode chegar a até 1% do valor da operação.
Em outubro, a 1ª Turma do STJ confirmou que a taxa de capatazia
não deve integrar o conceito de “valor aduaneiro” para fins de composição da
base de cálculo do Imposto de Importação. Em 2015, a 2ª Turma já tinha decisões
no mesmo sentido. Porém, a Fazenda Nacional ainda tem esperanças de reverter
esse posicionamento.
As importadoras entraram com ações judiciais após a
publicação pela Receita Federal da Instrução Normativa nº 327, de 2003, que
incluiu na base de cálculo do Imposto de Importação – que é o valor aduaneiro –
as despesas com capatazia.
A decisão da 1ª Turma foi unânime. Os ministros entenderam
que a instrução normativa da Receita Federal desrespeita os limites impostos
pelo Acordo de Valoração Aduaneiro e o Decreto nº 6.759, de 2009. As normas
estabelecem que somente devem ser computados no valor aduaneiro os gastos com
carga, descarga e manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada,
até a chegada ao porto ou aeroporto.
Pela instrução normativa, porém, devem ser incluídos os
valores desembolsados já em território nacional. “A realização de tais
procedimentos de movimentação de mercadorias ocorre apenas após a chegada da
embarcação, ou seja, após a sua chegada ao porto alfandegado”, afirma na
decisão o relator do caso, o ministro Benedito Gonçalves.
Na decisão, o ministro ainda cita precedentes da 1ª Turma e
da 2ª Turma no mesmo sentido. Na 2ª Turma, o caso foi relatado pelo ministro
Herman Benjamin. Os magistrados também entenderam que a instrução normativa da
Receita Federal extrapola o que foi determinado pelo Acordo de Valoração
Aduaneira e pelo Decreto nº 6759, de 2009.
O advogado Luis Augusto Gomes, do Tess Advogados, que
defende importadoras e indústrias, afirma que, com as decisões das duas turmas
que compõem a 1ª Seção do STJ, a tendência é que esse seja o entendimento
consolidado. Na sua opinião, por se tratar de assunto abordado em norma
infraconstitucional, são pequenas as chances de o Supremo Tribunal Federal
(STF) admitir um recurso. “Mesmo assim, a Receita Federal, com base na
instrução normativa, continua a cobrar o imposto com base de cálculo majorada”,
diz.
Para evitar maiores transtornos, o advogado tem recomendado
aos seus clientes que paguem o imposto sobre importação com a base de cálculo
majorada e entrem com uma ação judicial para discutir o tema com a intenção de
cancelar cobranças futuras e pedir restituição do que foi pago nos últimos
cinco anos.
“Recomendamos que as empresas aguardem o trânsito em julgado
das ações judiciais [quando não cabe mais recurso], sem a utilização de medidas
liminares, para evitar atrasos no procedimento de desembaraço aduaneiro das
mercadorias importadas”, diz Gomes.
O advogado tributarista Eduardo Kiralyhegy, do Negreiro,
Medeiros & Kiralyhegy, afirma que a jurisprudência consolidada no STJ
“irradia efeitos para os demais tribunais e abre caminho para teses mais
abrangentes”. Entre elas, a exclusão da capatazia (assim como a taxa de
utilização portuária – TUP) da base de cálculo de todos os tributos federais
devidos na importação – além do imposto de importação, o IPI e o PIS e a Cofins
Importação. Já existem decisões dos Tribunais Regionais Federais (TRFs) nesse
sentido.
Apesar dos julgados de turmas no STJ, Pedro Moreira, do CM
Advogados, diz que seria muito importante que o STJ julgasse o tema sob o rito
dos recursos repetitivos, “o que traria maior segurança jurídica para os
importadores”. Ele ressalta que mesmo com este entendimento favorável do STJ, o
Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) julgou recentemente o tema
de forma favorável ao Fisco. “O que contribui para a imprevisibilidade e falta
de segurança jurídica que são característicos do sistema tributário
brasileiro”.
A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), porém, não
acredita que a batalha judicial está perdida. Por nota, ressalta que há um
julgado em andamento na 2ª Turma do STJ e que há dois votos favoráveis para o
Fisco. Segundo a nota, “não se pode afirmar que o entendimento da 2ª Turma do
STJ esteja definido. Além disso, não há precedente próprio da 1ª Seção, no
sentido de que as despesas de capatazia poderiam ser subtraídas da base de
cálculo do Imposto de Importação, tal como postulam os contribuintes”. E
acrescenta que, assim como ainda não existiria um entendimento pacífico no STJ,
“não está a Receita Federal do Brasil autorizada a deixar de fazer as cobranças,
nos termos expostos”."
Fonte: Valor